terça-feira, 4 de junho de 2013

walden, ou a vida nos bosques 4


Às vezes perco as esperanças de conseguir qualquer coisa totalmente simples e honesta neste mundo, feita pelas mãos dos homens. Eles teriam de ser passados antes por uma prensa bem pesada, que espremesse fora todas as suas velhas idéias, e demoraria um pouco até ficarem de pé outra vez, e mesmo assim sobraria um deles com uma minhoca na cabeça, nascida de um ovo depositado ali ninguém sabe quando, pois nem o fogo consegue matar essas coisas, e vocês teriam tido aquela trabalheira à toa. Em todo caso, não vamos esquecer que, graças a uma múmia, chegou até nós um pouco de trigo egípcio.

Quando vejo como nossas casas são construídas e pagas, ou não pagas, e como é mantida a economia doméstica, admira-me que o chão não ceda sob os pés da visita que está a admirar as quinquilharias no console da lareira, e que ela não caia no porão, sobre uma base apenas ordinária, mas sólida e honesta. (...) Antes de enfeitar nossas casas com belos objetos, temos de descascar as paredes, e descascar nossas vidas, e trocar o belo modo de vida e a bela administração doméstica por bons alicerces: ora, o gosto pelo belo se cultiva melhor ao ar livre, onde não há casa nem administração doméstica.

Não que se deva desprezar todo e qualquer ornamento arquitetônico, mesmo nas épocas mais rústicas; mas que nossas casas primeiro se ornem de beleza pelo contato que têm com nossa vida, como a concha do molusco, sem se revestir com um peso adicional.

Quando um homem constrói sua casa, há aí um pouco da mesma aptidão com que uma ave constrói seu ninho. Quem sabe, se os homens construíssem suas moradias com as próprias mãos e providenciassem alimento para si e para suas famílias com simplicidade e honestidade, será que a faculdade poética não se desenvolveria de modo universal, tal como as aves universalmente cantam quando estão empenhadas nessas atividades? Mas, ai de nós!, fazemos como os chupins e os cucos, que botam seus ovos nos ninhos construídos por outros passarinhos, e não alegram ninguém com seus piados pouco musicais, Iremos sempre entregar o prazer da construção ao carpinteiro? O que a arquitetura representa na experiência da maioria dos homens? Em todos os meus passeios, nunca topei com alguém empenhado numa ocupação tão simples e natural como construir a própria casa. Fazemos parte da comunidade. (...) Claro que outra pessoa também pode pensar por mim; mas nem por isso é desejável que o faça e que eu deixe de pensar por mim mesmo.

O que vejo de beleza arquitetônica, sei que cresceu aos poucos de dentro para fora, brotando das necessidades e do caráter morador, que é o único construtor - brotando de alguma verdade inconsciente e da nobreza, sem jamais pensar na aparência; e qualquer beleza adicional desse gênero que vier a surgir será precedida por uma beleza da vida igualmente inconsciente.

Significaria alguma coisa se, em algum sentido importante, tivesse sido [o morador] a colocar os paus e a pintar sua casa; mas, tendo o espírito abandonado o morador, é a mesma coisa que cosntruir seu próprios caixão - a arquitetura da tumba, e "carpinteiro" é só um outro nome para "fazedor de caixão".

As coisas que demandam a maior parte do dinheiro nunca são as coisas de que o estudante mais precisa.

THOREAU, H. D. Walden, ou A Vida nos Bosques.

Um comentário:

  1. Você é linda.. completa.. aquele que na primeira se admira de olhar e com o passar do tempo se apaixona ao conhecer.. Infelizmente você é muito pra mim, mas eu digo que quem conseguir te conquistar ou ter você ao lado, esse sim é uma cara de sorte.

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