quarta-feira, 19 de setembro de 2012

da linha tênue


conversar é bacana, né. embora eu não tenha muita paciência pras pessoas, às vezes vejo tantos pontos bons na troca de informação... estava ilustrando as relações amorosas, contando algo que me acontece com frequência.
e causo vai, causo vem, associaram certa história minha com essa música. caramba, casou perfeitamente.

todo lugar que chego você não fica
tudo o que eu te peço você não dá
se dou opinião, você implica

por que fazer questão deste jogo duro e de me mostrar o muro a nos dividir?
seu coração de fato está escuro ou por detrás do muro  tem mais coisa aí?

toda vez que passo você não nota
eu conto uma lorota e você nem ri
me faço fina flor, você vem  e desbota
me boto numa fria, não socorre
eu cavo um elogio - isso nem te ocorre?
a indiferença escorre fria a me ferir
será porque você não me suporta?
ou dentro dessa porta tem mais coisa aí?

entre o bem e o mal a linha é tênue, meu bem
entre o amor e o ódio a linha é tênue também
quando o desprezo a gente muito preza, 
na vera o que despreza é o que se dá valor
falta descobrir a qual desses dois lados convém
sua tremenda energia pra tanto desdém
ou me odeia descaradamente ou disfarçadamente me tem amor

e numa dessas boas conversas, falávamos de literatura e da maneira como os adolescentes lidam com ela. um amigo disse que um aluno do cursinho perguntou o que a literatura tem a ver com a nossa vida. ora, tanto quanto as músicas. mostra que mais alguém aí fora já sentiu o que você sente, já pôs pra fora algo que você por muitas vezes quis gritar e não fez por não saber como ou por não ter força mesmo. ta aí a prova, pô!

terça-feira, 18 de setembro de 2012

à une passant - II

quando você vem ou não?
o que você quer de mim?
deixo por aí...
o que você tem?
de onde você é?
pode me esquecer se você quiser
ou se deixar chover, se você vier, eu vou te acompanhar de fitas
te ajudo a decorar os dias
te empresto [meu dia de sol]
vamos nos espalhar sem linhas
ver o mundo girar de cima no tempo da preguiça

mas tudo bem, o dia vai raiar pra gente se inventar de novo

o que você é enfim?
onde você tem paixão?
segue por aí...
eu não sou ninguém de mais
e você também não é
é só rodopiar em busca do que é belo e vulgar

vamos onde ventar, menina
foi bom te encontrar lá em cima
odeio despedida

mas tudo bem, o dia vai raiar pra gente se inventar de novo
e o mundo vai nascer de novo

*  *  *

Ailleurs, bien loin d'ici! trop tard! jamais peut-être!
Car j'ignore où tu fuis, tu ne sais où je vais,
Ô toi que j'eusse aimée, ô toi qui le savais!

Charles Baudelaire

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

do colinho de mãe

eu sou mãe. tenho dois guris pra cuidar. e os amo dum jeito que eu realmente não imaginava que era possível. é amor de graça mesmo, mas que não foi instantâneo: eu fui aprendendo dia após dia.

a sociedade cobra muito sobretudo das mulheres. nós temos de: 1) querer mais que tudo nessa vida ter filhos; 2) amá-los incondicionalmente acima de qualquer coisa. eu sinto as coisas dum modo diferente. acho que sentir amor pelo seu próprio filho é algo bom, mas quando é SÓ esse amor que se experimenta, de nada vale. de que adianta amar o filho e detestar o filho da vizinha? cuidar do seu rebento mas negar-se a ajudar qualquer pessoa que necessite de você?

entende-se que amor de mãe é aquela entrega absoluta sem medida, cheia de carinhos, abraços, afagos e mimos. minha mãe não é daquelas carinhosíssimas, que enchem a criança de dengos e tal. não tem abraço, beijinho, nada disso. o amor dela, no entanto, pôde ser visto e apreciado por mim em outras formas: nas frutinhas cortadas TODOS OS DIAS antes de sair pra escola, no fato de andar kilômetros no sol levando nossas mochilas pra garantir que chegássemos na escola, nos livros que pegava na biblioteca pra gente ler, na comidinha sempre pronta, sempre fresquinha... devo a esse amor grande parte do que levo hoje de disciplina, cuidado, estudo. e como dizer que não é amor?

essas observações e algumas experiências acabaram me mostrando que eu devo canalizar minha vontade de cuidar para outro âmbito que não o da família convencional. mais ou menos assim: ter um filho é criar uma vida. ela não existia antes de você inventar história. esse filho nasce completamente dependente de você. se tirarmos o romantismo criado nos últimos séculos em torno da criança, o que temos é a criação de um problema que você poderia ter evitado. como resolveu contribuir com mais um ser humano pra terra, o mínimo esperado é que cuide dele pessoalmente. 

de todo modo, é só uma opinião. tem pessoas que querem mesmo ter filhos e sentem essa necessidade - e isso é até bom, garante a perpetuação da espécie, embora eu também não esteja certa sobre os benefícios de continuarmos nos reproduzindo... acho digníssimo esse instinto materno de algumas mulheres, mas acho urgente que elas repensem se é de fato vontade de amar ou carência. pois mais me parece um mecanismo: você cria algo que vai depender demasiadamente de você porque, na verdade, é você quem está carente e essa necessidade que o outro tem de tomar seu colo te faz maior, te preenche, te garante aquilo tudo que você sozinha não consegue.

a verdade é que o adulto, imerso em carências mil, necessita de algo que dele dependa. com isso, vem uma série de expectativas que, quando quebradas, fazem cair um universo. vira e mexe escuto que ter filho é garantir que alguém irá cuidar da gente na velhice. ah, ledo engano... ter um filho não é garantia de nada - se é, certamente é de trabalho árduo e sem descanso. uma velhice tranquila e com cuidado vem de outros aspectos: alimentação, exposição ao sol, cuidado com o corpo, cuidado com a mente, cuidado com a alma, e PRINCIPALMENTE semear amor. quem semeia amor colhe ele, não tem jeito. é a lei. ter um filho e criá-lo sob bases líquidas não garante absolutamente nada. garantia, a propósito, nunca há. o que se tem é a ação e a reação. 

depois de ter meus nenéns, aprendi um amor maior, o cuidado gratuito, o sorriso sem esperar nada, o desprendimento de interesse. e tento dia após dia dissolver qualquer apego que possa surgir, medo de que eles sumam e não voltem mais. porque o importante mesmo é a qualidade da nossa convivência, é o amor que sinto nos olhos deles e que passo a eles pelo meu olhar. exercitar esse amor todos os dias é uma dádiva, e não pára aqui, não se esgota na relação mãe-filhos: quando o motor está certo, o sentimento se estende para outros cantos, e consigo ver a cada dia que minha impaciência se dilui, minha falta de saco pras pessoas vai cedendo lugar à compaixão... não é da noite pro dia, nunca é. mas para mim esse tem sido o processo. o amor que sinto neles passa por mim e eu sirvo de instrumento para ativá-lo na vida como um todo. se não fosse assim, o sentimento se esgotaria em si mesmo, e a idéia não é essa, é ser amor produtivo, que nos ensina na prática, nos renova, nos faz repensar e sentir ao inverso do que era antes.


segunda-feira, 10 de setembro de 2012

pra agradecer ao universo


nalgum lugar em que eu nunca estive
alegremente além de qualquer experiência
teus olhos tem o teu silêncio
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram
ou eu que não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra

me abres sempre pétala por pétala, como a primavera abre
tocando sutilmente, misteriosamente a sua primeira rosa

nada que eu possa perceber neste Universo iguala o poder de tua intensa fragilidade
cuja textura compele-me com a cor de seus continentes
restituindo a morte e o sempre cada vez que respirar

não sei dizer o que há em ti que fecha e abre
só uma parte de mim compreende que a voz dos teus olhos  é mais profunda que todas as rosas
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão macias...

das datas do coração - parte III


ah, a minha princesa... o maior amor do meu coração, meu coração batendo noutro corpo, minha inteireza e entendimento perfeito. não tem palavras, por mais que eu tente dizer e dizer e dizer, não tem jeito. precisa viver, nos ver juntas em dias de sol, em dias de chuva de canga na praia encarando o mundo e se propondo a viver e sorrir ainda que as coisas não estejam do jeito que queremos. 


ela é toda e qualquer cor que meus olhos vejam, é com ela que eu faria tudo que faço, cada caminhar, cada descoberta. a vida se abre em danças pra nós, para sermos penélope e sabrina sempre, ainda que distantes, cada uma no seu compasso que no fundo é o mesmo compasso. porque as lições e os amores e a vida toda nos vem sempre em ciclos iguais, nos une mais e mais a cada instante assim. somos almas irmãs, e certamente caminhamos juntas em tantas outras dimensões, há infinito tempo. 



e nós agora, as duas, com a mesma idade, mais perto dos 30 que dos 20, oficialmente. e isso pouco importa, daqui a pouco estaremos mais próximas dos 40, dos 50 dali a um tempo. só que seremos o que somos hoje e sempre fomos, adolescentes descalças andando de trem, soltas no mundo, com ar de liberdade que temos, falando toda sorte de alegrias e vivendo como nós bem sabemos: oferecendo sorrisos ao mundo!






terça-feira, 4 de setembro de 2012

do fundo da terra ao coração do Brasil


não é difícil compreender meu amor pelo pantanal. até aqueles menos sensíveis à natureza hão de concordar com a magnitude da beleza pantaneira...

o pantanal pra mim tem diversos significados. ele está colorindo as lembranças de 2008, quando eu vivia um amor belo que tem sons de viola e paisagens róseas. o pantanal era nosso sonho, refúgio, vontade, lugar de ir pra viver cada dia como se fosse um amor que começa, e nossa alegria chama, e um violeiro tocava em nossa cama, que era o mundo.


o pantanal é um som lindo, de aves que cá não vem, de cores de céus que cá não aparecem. é como se um mundo à parte, algo que o universo esconde ali no meio que é mesmo pra ninguém ir tocar. é pra ficar ali, preservado, distante, longe pra chegar.

tenho a impressão, nítida, de que a vida vai me conduzir pra lá. ou será que essa impressão já me fará, de certo modo, tomar minha própria condução praqueles lados? seja como for, eu findo bem no pantanal, eu vejo bem, sinto bem, vivo bem. 

meu coração, na verdade, já está lá, já é nativo. desde aquelas noites em que saía mais cedo das aulas pra chegar em casa a tempo de assistir a novela de cenas e histórias mais belas que há. eu olhava pra janela, contava 5 andares de baixo pra cima, ou desde o décimo segundo de cima pra baixo, pra ver se a luz da sala estava acesa e se o meu amigo-amor-companheiro estava lá sentado no sofá - ou no chão, como a gente gostava - me esperando pra mais um capítulo.


a vida vai mudando os traçados e fazendo o desenho que bem entende das nossas histórias. eu sou grata pelo traçado que segui, por ter entendido logo cedo que lá é meu lugar, um dos tantos lugares que temos na vida. pode ser limeira, acre, natividade da serra, mas no meu coração é sempre mais o pantanal, é sempre mais.

os caminhos de rio, a vida que parece pulsar num outro tom, num outro tempo. o dia começa e termina numa beleza, num espetáculo divino, num horizonte de aquarela que ninguém jamais pintou. 

Dia de tudo ter ou de nada ter
Desde cedinho horas pra se viver
Dia para plantar
Dia pra colher
O mesmo dia de sempre
O velho sol
Se esparramando pelo Pantanal.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

ao que me ensina

só admiração. só bons sentimentos, só sorrisos. sorrisos largos bem azuis, de dia claro ou de dia de cinza pra gente fazer clarear dentro de nós. 

no andar, sobretudo. no andar percebendo mais que os olhos, mais que os sons, percebendo a vida que movimenta.



ah, que sorte, que mérito, que honra, enfim, te reencontrar aqui embaixo! porque lá nós também somos, aprendemos juntos...

de todas as belas coisas - e foram muitas! - que já vi em você, uma das mais encantadoras foi vê-lo levantar do chão, hoje de manhã: antes mesmo de saber se estava inteiro, veio até mim, ver se eu estava bem. antes que eu pudesse me dar conta do que houve, você estava bem diante de mim, segurando minha mão, pra se certificar de que comigo nada tinha acontecido. 

foi uma das cenas mais bonitas que meu coração sentiu.

cheguei a pensar, durante o dia: e se tivéssemos ido? um, o outro, ou os dois? caramba... daí nos percebemos frágeis e entendemos que aqui só havemos de doar, e doar, e doar sobretudo AMOR, porque, afinal, é o único legado que se faz possível.