quinta-feira, 13 de setembro de 2012

do colinho de mãe

eu sou mãe. tenho dois guris pra cuidar. e os amo dum jeito que eu realmente não imaginava que era possível. é amor de graça mesmo, mas que não foi instantâneo: eu fui aprendendo dia após dia.

a sociedade cobra muito sobretudo das mulheres. nós temos de: 1) querer mais que tudo nessa vida ter filhos; 2) amá-los incondicionalmente acima de qualquer coisa. eu sinto as coisas dum modo diferente. acho que sentir amor pelo seu próprio filho é algo bom, mas quando é SÓ esse amor que se experimenta, de nada vale. de que adianta amar o filho e detestar o filho da vizinha? cuidar do seu rebento mas negar-se a ajudar qualquer pessoa que necessite de você?

entende-se que amor de mãe é aquela entrega absoluta sem medida, cheia de carinhos, abraços, afagos e mimos. minha mãe não é daquelas carinhosíssimas, que enchem a criança de dengos e tal. não tem abraço, beijinho, nada disso. o amor dela, no entanto, pôde ser visto e apreciado por mim em outras formas: nas frutinhas cortadas TODOS OS DIAS antes de sair pra escola, no fato de andar kilômetros no sol levando nossas mochilas pra garantir que chegássemos na escola, nos livros que pegava na biblioteca pra gente ler, na comidinha sempre pronta, sempre fresquinha... devo a esse amor grande parte do que levo hoje de disciplina, cuidado, estudo. e como dizer que não é amor?

essas observações e algumas experiências acabaram me mostrando que eu devo canalizar minha vontade de cuidar para outro âmbito que não o da família convencional. mais ou menos assim: ter um filho é criar uma vida. ela não existia antes de você inventar história. esse filho nasce completamente dependente de você. se tirarmos o romantismo criado nos últimos séculos em torno da criança, o que temos é a criação de um problema que você poderia ter evitado. como resolveu contribuir com mais um ser humano pra terra, o mínimo esperado é que cuide dele pessoalmente. 

de todo modo, é só uma opinião. tem pessoas que querem mesmo ter filhos e sentem essa necessidade - e isso é até bom, garante a perpetuação da espécie, embora eu também não esteja certa sobre os benefícios de continuarmos nos reproduzindo... acho digníssimo esse instinto materno de algumas mulheres, mas acho urgente que elas repensem se é de fato vontade de amar ou carência. pois mais me parece um mecanismo: você cria algo que vai depender demasiadamente de você porque, na verdade, é você quem está carente e essa necessidade que o outro tem de tomar seu colo te faz maior, te preenche, te garante aquilo tudo que você sozinha não consegue.

a verdade é que o adulto, imerso em carências mil, necessita de algo que dele dependa. com isso, vem uma série de expectativas que, quando quebradas, fazem cair um universo. vira e mexe escuto que ter filho é garantir que alguém irá cuidar da gente na velhice. ah, ledo engano... ter um filho não é garantia de nada - se é, certamente é de trabalho árduo e sem descanso. uma velhice tranquila e com cuidado vem de outros aspectos: alimentação, exposição ao sol, cuidado com o corpo, cuidado com a mente, cuidado com a alma, e PRINCIPALMENTE semear amor. quem semeia amor colhe ele, não tem jeito. é a lei. ter um filho e criá-lo sob bases líquidas não garante absolutamente nada. garantia, a propósito, nunca há. o que se tem é a ação e a reação. 

depois de ter meus nenéns, aprendi um amor maior, o cuidado gratuito, o sorriso sem esperar nada, o desprendimento de interesse. e tento dia após dia dissolver qualquer apego que possa surgir, medo de que eles sumam e não voltem mais. porque o importante mesmo é a qualidade da nossa convivência, é o amor que sinto nos olhos deles e que passo a eles pelo meu olhar. exercitar esse amor todos os dias é uma dádiva, e não pára aqui, não se esgota na relação mãe-filhos: quando o motor está certo, o sentimento se estende para outros cantos, e consigo ver a cada dia que minha impaciência se dilui, minha falta de saco pras pessoas vai cedendo lugar à compaixão... não é da noite pro dia, nunca é. mas para mim esse tem sido o processo. o amor que sinto neles passa por mim e eu sirvo de instrumento para ativá-lo na vida como um todo. se não fosse assim, o sentimento se esgotaria em si mesmo, e a idéia não é essa, é ser amor produtivo, que nos ensina na prática, nos renova, nos faz repensar e sentir ao inverso do que era antes.


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